A Caixa Cultural do Rio de Janeiro realizou, no ano passado, a mostra “Cinema Centro América”, com uma seleção de vinte títulos do cinema recente da América Central. São produções da Guatemala, Belice, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica e Panamá. Infelizmente, só pude ver três filmes da mostra. Um desses filmes eu vou me poupar de falar aqui. E, também, por questões de delicadeza, não direi qual é. Já os outros dois foram muito bons e farei uma pequena análise.
O primeiro desses filmes vem da Nicarágua e se chama “La Yuma”, realizado em 2009, de noventa minutos de duração e dirigido por Florence Jaugey. A história se passa em torno da trajetória de Yuma (interpretada por Alma Blanco), uma jovem de vinte anos que mora na periferia, tem um físico forte e deseja ser lutadora de boxe. Seu bairro fica numa zona muito violenta, e seus amigos fazem parte de gangues, sendo que eles acham que, pelo fato de Yuma ser mulher, podem apitar em sua vida. Na casa da mãe, sua progenitora tem um namorado imprestável e pedófilo, que molesta seguidamente a irmãzinha e Yuma. Todo esse ambiente altamente inóspito obriga a nossa protagonista a ser muito braba, dura na queda mesmo. Mas nem tudo são espinhos. Por uma dessas coincidências da vida, ela começa a namorar Ernesto (interpretado por Gabriel Benavides), um jovem de classe média alta, e eles têm um romance altamente idílico. Mas o abismo social entre os dois faz das suas e eles acabam se afastando. Chorar pelos cantos? Jamais! O negócio é enfiar a porrada em quem melou o namoro. Mas o filme, abertamente compromissado com a realidade nesse ponto, não reata o namoro (ainda bem, um “happy end” dessa magnitude não teria espaço aqui). Um alívio cômico bem vindo no filme é a patroa de Yuma. Nossa protagonista, para ganhar a vida, precisa trabalhar numa “tienda” de roupas femininas, tendo inicialmente um pouco de dificuldade para isso, em virtude de seu jeito rude e bronco. Yuma tem uma patroa que atua como uma burguesa implacável com sua empregada em seu início mas, pouco a pouco, seu aspecto mais cômico e bonachão vai tomando conta da personagem e a gente acaba simpatizando com ela.
Uma coisa que chama muito a atenção é o desfecho. Se a diretora optou por um choque de realidade ao longo de todo o filme, no final ela lançou mão de um “happy end”. Mas não um “happy end” clichê como a volta para os braços de Ernesto, mas sim algo mais surpreendente e inusitado, dando um toque altamente lúdico para um filme que foi muito ácido pela denúncia social em quase toda a sua duração. Pode-se dizer que foi uma espécie de “cereja do bolo”.
Assim, “La Yuma” foi uma grata surpresa da Mostra “Cinema Centro América”, que foi organizada pela Caixa Cultural do Rio de Janeiro. Um filme de forte denúncia das más condições de vida das populações menos favorecidas; um filme que mostra a violência das periferias; um filme que mostra o abismo social entre dois amantes; um filme de toque lúdico ao seu final; e um filme de uma personagem forte, muito forte, em todos os sentidos, colocando por terra qualquer tentativa de empoderamento feminino anglo-saxão. A Gal Gadot precisava dar uma conferida nesse filme e conhecer Yuma.