Batata Literária – Penumbra

Eu sou a penumbra.
Aquela que está entre o claro e o escuro,
entre o amor e o ódio,
entre a alegria e a tristeza,
entre a tolerância e a intolerância,
entre a afeição e o desprezo.
Sou a linha tênue que une as dicotomias.
Estou espremida entre forças opostas.
Eu sou muito desfocada
e tento separar coisas bem definidas,
ou tento unir coisas bem definidas?
Essa indefinição me angustia,
essa indefinição me indefine.
Sou o sim ou sou o não?
O mais ou menos não me satisfaz.
De que lado estou?
Ou será que tenho uma função mediadora?
Tenho aversão aos extremos?
Tenho aversão aos exageros?
Serei, então, um ponto de equilíbrio?
Tenho função de acalmar forças tão opostas?
Oh, que tarefa ingrata
dada a alguém tão delicada, fina e tênue como eu!
Por que me foi dado tão pesado fardo?

Talvez eu tenha recebido esse malfadado trabalho
justamente por ser tão frágil
para que todos se lembrem
que os equilíbrios são muito instáveis
à medida que os extremos se tornam tão violentos.
Por isso, sou tão fina,
tão quebradiça e tão delicada,
sucumbindo à ignorância dos exageros.

penumbra

Batata Movies – Doutor Estranho. Medicina, Misticismo e Princípio da Incerteza.

Cartaz do Filme
Cartaz do Filme

Por Carlos Lohse

A Marvel dá mais uma de suas boas cartadas. Estreou no cinema o esperado “Doutor Estranho”, estrelado por Benedict Cumberbatch, e que tem Mads Mikkelsen fazendo o papel do vilão. Somente esses pequenos detalhes já justificam a ida ao cinema, antes de mais nada. Mas o filme tem mais, muito mais, pois ele consegue abordar temas muito interessantes. Só quero fazer uma observação aqui. Esse artigo terá “spoilers”. Espero que você já tenha visto o filme. Caso contrário, volte mais tarde.

Vemos aqui a história do Doutor Stephen Strange (interpretado por Cumberbatch), um competente neurologista com uma carreira de muito sucesso. Isso faz com que Strange tenha um comportamento extremamente arrogante, provocando a antipatia de muita gente. A única pessoa que ainda consegue aturá-lo é outra neurologista, Christine Palmer (interpretada por Rachel McAdams), colega de profissão e ex-namorada. Um belo dia, Strange, que é um cara muito bem de vida financeiramente e é cercado de bens materiais, está em seu possante carro falando ao celular sobre qual cirurgia ele fará, e acabou sofrendo um grave acidente por isso, que destrói suas hábeis mãos para cirurgias muito delicadas. Desesperado por não poder mais conseguir exercer seu ofício, ele descobre com seu fisioterapeuta um paraplégico que conseguiu voltar a andar. Ao falar com ele, este lhe indicou um endereço no Nepal. Lá, Strange conhece a anciã (interpretada por Tilda Swinton), que vai lhe revelar os segredos do misticismo e a existência do multiverso. Mas um antigo aluno da anciã, Kaecilius (interpretado por Mads Mikkelsen), quer permitir que uma entidade cósmica maligna invada a Terra sob a promessa de vida eterna. Strange, então ainda um aprendiz, vai ter que evitar que os planos de Kaecilius se concretizem para salvar o planeta.

Um neurocirurgião irado!!!
Um neurocirurgião irado!!!

Dá para perceber que o enredo é bem interessante. A coisa aparentemente cai num lugar comum da velha história do materialista fútil e arrogante que descobre a elevação espiritual no misticismo. Mas a película não fica apenas nessa boa lição. A medicina, área de atuação de Strange, e representante da ciência no filme, não fica relegada a um segundo plano e aparece recorrentemente como um recurso necessário ao longo da história, como se a sabedoria do misticismo se aliasse à sabedoria da ciência. Mas o mais incrível aqui é a ideia de que há um multiverso, ou seja, a existência de vários universos possíveis, além de portais que vão de um lugar para outro. Essas ideias são muito relacionadas à mecânica quântica e à física da relatividade geral. Os portais lembram muito a noção de buracos de minhoca, onde corpos com muita massa e muito densos (os conhecidos buracos negros) distorcem a estrutura do espaço-tempo de tal forma que poderiam provocar “atalhos” entre duas regiões do Universo. No filme, entretanto, esses buracos de minhoca seriam provocados pelo misticismo e magia dos aprendizes da anciã. Já a ideia de multiverso é associada à mecânica quântica, mais especificamente ao Princípio da Incerteza de Heisenberg. Esse princípio diz que, para conhecermos o movimento de um átomo ou outra partícula qualquer, devemos conhecer simultaneamente sua posição e velocidade. O problema é que não conseguimos essa determinação simultânea. Só podemos conhecer ou a posição ou a velocidade, nunca as duas ao mesmo tempo. E isso é uma limitação imposta pela própria natureza. Assim, para cada posição que determinamos, temos infinitas possibilidades de velocidade, e, para cada velocidade que determinamos, temos infinitas possibilidades de posição. E o que tudo isso quer dizer? Que este Universo em que vivemos é apenas um de muitos prováveis, ou seja, somos todos ondas de probabilidade. Eu poderia até entrar em questões mais complexas e polêmicas do tipo: se tudo agora é probabilidade, como fica Deus, algo altamente determinístico, num contexto desses, mas vamos parar por aqui, já que temos um filme a analisar. Então, a existência na película de um multiverso, onde há uma infinidade de universos possíveis, tem tudo a ver com o Princípio da Incerteza cunhado pelo físico atômico Werner Heisenberg. O mais legal foi ver essas associações entre a física relativística e a mecânica quântica com o misticismo. Os físicos e astrofísicos que não me ouçam, mas essas formas científicas de conhecimento sempre tiveram um quê místico aos olhos do grande público, sobretudo a mecânica quântica, um assunto muito hermético para a grande maioria das pessoas. Ver isso em “Doutor Estranho” só confirma tal hermetismo e mito que associam saberes tão diferentes (ciência e misticismo).

Kaecilius. Poder de Persuasão.
Kaecilius. Poder de Persuasão.

O que mais podemos falar do filme? Algumas coisas que já detectamos no Universo Marvel em outras ocasiões. Em primeiro lugar, a vinda de um novo herói sempre é muito bem vinda, já que um dos principais problemas dessa franquia é o excesso de filmes de herói, tornando a coisa até um certo ponto repetitiva. Tem-se, então, a necessidade de uma renovação constante, que leva ao surgimento de novos heróis nas telonas, algo que a Marvel consegue fazer bem, pois tem um celeiro praticamente inesgotável de super-heróis. Em segundo lugar, o humor novamente deu o ar de sua graça, mesmo que o personagem do Doutor Estranho tenha uma aparência um tanto soturna. Vou sempre defender esse conteúdo mais humorístico da Marvel, pois ele funciona e traz aquela coisa nova de que os filmes precisam, ressaltando sempre que fazer humor é algo extremamente difícil.

Um discípulo, uma mestre e um bibliotecário sisudo
Um discípulo, uma mestre e um bibliotecário sisudo

E os atores? Bom, eu acho que nem preciso dizer muito. Dessa vez, a Marvel caprichou muito no elenco, colocando somente cobras criadas. Cumberbatch foi muito bem como o médico arrogante que se regenera, arrancando simpatia do espectador. Mikkelsen, o atorzaço de sempre, mostrou grande poder de persuasão ao tentar convencer o Doutor Estranho à sua causa. Tilda Swinton, que já tinha ido muito bem em papéis altamente díspares nos filmes “Amantes Eternos” e “O Grande Hotel Budapeste”, prova novamente seu lado camaleônico ao fazer uma anciã que é a mestre do protagonista, e, ao mesmo tempo, desperta dúvidas em seus discípulos à respeito de sua integridade moral. E temos Chiwetel Ejiofor, aquele ator de nome complicadíssimo que protagonizou “12 Anos de Escravidão”, e que aqui interpreta Mordo, o principal discípulo, o mais cheio de dúvidas em relação à sua mestre, com uma interpretação contida e sóbria, até em seus maiores momentos de decepção.

Comprem o Gibi!!!!
Comprem o Gibi!!!!

Assim, “Doutor Estranho” é mais um tiro certo da Marvel, que conseguiu mostrar o seu poder de renovação, além de repetir o que vem dando certo, que é o humor. Um filme laureado por um excelente elenco, que dá credibilidade aos personagens. Uma película que usa o misticismo como mote principal, sem esquecer a importância da ciência. E, como em todos os filmes da Marvel, com pós-créditos. Dois, para ser mais exato. Não saia da sala até a última letrinha e além. Você não vai se arrepender. Programa imperdível! E não deixe de ver o trailer abaixo.

Batata Movies – O Contador. Um Ben Affleck Esquisitão.

Cartaz do Filme
Cartaz do Filme

Por Carlos Lohse

Um filme americano meio demodê em nossas telonas. “O Contador” lembra muito aquelas películas americanas de superviolência da década de 80, quando tiros de metralhadora em profusão retalhavam exércitos inteiros vivos. Convenhamos, mesmo os filmes de ação mais violentos de hoje em dia não têm mais esse perfil. Tudo bem que o “tiro, porrada e bomba” ainda está por aí, mas talvez num tom um pouco mais caricato ou seja, como coadjuvante da ação. Já em “O Contador” temos mais a ação como coadjuvante da violência.

Wolff, um sujeito soturno
Wolff, um sujeito soturno

O filme fala de um certo contador, Christian Wolff (interpretado por Affleck), um sujeito muito esquisitão, que teve uma infância regada a muitos traumas psicológicos, tanto por parte de mãe quanto por parte de pai. Mas esse lado psicológico totalmente descalibrado esconde um talento monstruoso para números e memorização. Isso faz com que Wolff se torne um grande contador na idade adulta, mas com um jeitão extremamente soturno e antissocial. Devido ao seu ótimo talento com números, Wolff torna-se o contador de pessoas muito perigosas. E aí, a sua vida passa a ficar ameaçada o tempo todo. Simultaneamente, ele é investigado por órgãos do governo americano, em virtude de suas ligações muito perigosas. Está armado o terreno para um filme com altas doses de violência explícita. Em tempo: o nosso protagonista não é um mocinho indefeso nas mãos de perigosos e violentos bandidos, já que ele tem um quê psicótico terrível.

Dana, uma "outsider"
Dana, uma “outsider”

O que dizer mais de um filme como esse? Apesar de altamente manjado em sua violência de anos 80, a película conta com um bom elenco. Além de Affleck, que está muito bem como o antissocial e psicótico contador, temos a ótima presença de J. K. Simmons (esse cara é realmente um excelente ator!) como Ray King, o agente do governo que está no encalço de Wolff e que tem uma ligação com o contador (chega de “spoilers”), uma grata presença de John Lithgow (só par reforçar o climão anos 80 do filme) e Anna Kendrick (a Cinderela de “Caminhos da Floresta”), que interpreta Dana Cummings, uma contadora também de passado introspectivo que serviu como um arremedo de par romântico com Wolff. A moça foi muito bem no seu papel de “outsider”. O filme ainda contou com a presença menos conhecida de Cynthia Addai-Robinson, como a agente Medina, de passado delinquente e que fica nas mãos de King, sendo obrigada a investigar a vida de Wolff. Assim, podemos dizer que o elenco vale a pena.

Medina e King. No encalço de Wolff
Medina e King. No encalço de Wolff

Uma coisa que ficou legal foi a alta dose de humor negro em alguns momentos do filme, principalmente depois que Wolff despejava seu pacote de maldades em cima de seus inimigos. Isso aliviava de uma certa forma a forte tensão da película, que poderia se tornar maçante e repulsiva caso não houvesse tal alívio cômico.

Um problema foi a alta quantidade de personagens que aparecem e desaparecem no transcorrer da trama, não ficando muito claro às vezes quem é quem e de que lado o personagem está. Deu a impressão de que o roteiro ficou um tanto mal escrito. É o tipo do filme que exige uma atenção redobrada do espectador.

Participação de John Lithgow. Climão dos anos 80
Participação de John Lithgow. Climão dos anos 80

Assim, “O Contador”, apesar de carregar muito nas tintas no quesito violência e de um herói com atitudes extremamente questionáveis, ainda assim é um bom filme, pois conta com medalhões de um naipe de um Ben Affleck, J. K. Simmons e John Lithgow, assim como tem uma alta dose de humor negro que compensa uma violência extrema pouco justificada por uma trama um tanto mal contada. É um filme que podemos dizer que é digno de atenção.

Batata Movies – Nosso Fiel Traidor. Ética Num Mundo Antiético.

Cartaz do Filme
Cartaz do Filme

Por Carlos Lohse

Um curioso filme em nossas telonas. “Nosso Fiel Traidor” é inspirado numa história de John Le Carré, o conhecido escritor de histórias de espionagem. Quando pensamos nesse gênero, ainda mais com esse autor, nos remetemos imediatamente aos tempos de Guerra Fria, quando a União Soviética era uma sólida inimiga dos Estados Unidos. Mas este não é o caso aqui. Podemos dizer que essa história tem ligações com a Rússia pós-socialismo, já inteiramente adaptada ao capitalismo, com todas as influências da máfia russa agora nos holofotes principais.

McGregor: nobreza jedi

Do que consiste a história? Vemos aqui um casal em crise passando férias em Marrakesh para recuperar a relação. O marido é Perry (interpretado por Ewan McGregor), um professor universitário de poesia, e a esposa é Gail (interpretada por Naomie Harris), uma promotora bem sucedida. Uma noite num bar, o casal é observado por um grupo de homens muito mal encarados. Gail se desentende com Perry e o deixa sozinho no bar. É o momento em que um dos homens se aproxima. Ele é Dima (interpretado por Stellan Skarsgard), um russo que consegue ser simultaneamente de comportamento muito rude e muito amistoso e persuasivo. Ele convence Perry a ir a uma festa estranha de gente esquisita. E, aos poucos, o professor se aproxima cada vez mais do russo e de sua família, levando a esposa a reboque. Um belo dia, Dima revela a Perry que ele e sua família estão ameaçados pela máfia russa e pretende fazer aquilo que em terras tupiniquins é chamado de “delação premiada”, ou seja, ele entrega o nome de todos os mafiosos russos que usam dinheiro sujo para abrir um banco em Londres em troca de proteção para ele e sua família. Perry recebe de Dima um pen drive com alguns dados que serão entregues a representantes do MI6. Está criado um ambiente onde um casal normal acaba se envolvendo com gente muito, muito casca grossa.

Skarsgard arrebentou!
Skarsgard arrebentou!

Quais são os elementos de destaque dessa película? Em primeiro lugar, é uma história muito bem escrita e contada, o que confirma toda a notória genialidade de le Carré para tramas de espionagem. A gente fica com os olhos vidrados na tela o tempo todo, esperando o próximo lance desse jogo de xadrez que é o filme, onde o perigo está à espreita o tempo todo. Dima é seguido sistematicamente pelos próprios seguranças, que o perseguem em nome de Príncipe, o chefão da máfia russa. E a graça da coisa está na forma como os protagonistas precisam incessantemente driblar os vilões da história, o que carrega a trama com muito suspense, colocando a ação em segundo plano. Em segundo lugar, o elenco. Skarsgard simplesmente arrebentou nesse filme, sendo talvez uma das melhores atuações de sua carreira. Ele conseguiu dar ao seu personagem rústico e durão um enorme carisma, assim como um lado muito humano. Ele realmente consegue conquistar o público aos poucos. Já McGregor convence como o cara certinho, que se mostra extremamente intolerante com violências contra as mulheres da película, tendo um comportamento ético e moral digno de um Obi Wan Kenobi. Naomi Harris esteve muito bem, e foi legal ver a moça ter mais espaço para mostrar todo o seu talento, ao contrário de suas atuações como “bondgirl”. Destaque deve ser dado também a Damian Lewis, no papel de Hector, o policial que negocia com Dima, negociação essa cheia de momentos tensos, o que enriqueceu a história. Lewis conseguiu dar ao personagem uma empáfia e arrogância que incomodavam.

Harris: mais do que uma "bondgirl"
Harris: mais do que uma “bondgirl”

O mais curioso aqui é que esse filme fala muito de conteúdo moral num meio totalmente imoral, que é o crime organizado. Um casal normal, que mal conhece um criminoso que lava dinheiro, se dispõe a arriscar a própria vida para salvar a família do criminoso. Esse paradoxo, digno dos melhores jedis (desculpem-me repetir a piada, mas não resisto) é um grande barato nessa história e a motivação principal das ações dos protagonistas, conferindo algo um pouco diferente para histórias de espionagem, onde le Carré comprova que pode criar tramas com pessoas consideradas normais, ou seja, fora dos limites do meio da espionagem, e com valores morais e éticos, algo pouco visto entre assassinos, criminosos e espiões com licença para matar.

Lewis: um agente arrogante
Lewis: um agente arrogante

Assim, “Nosso Fiel Traidor” é mais uma daquelas películas altamente recomendadas, pois tem uma excelente história, um bom elenco, e protagonistas que não são espiões em si, mas pessoas comuns do dia a dia, pautadas por valores éticos. Vale a pena dar uma conferida neste filme. E não deixe de ver o trailer abaixo.

Batata Antiqualhas – Battlestar Galactica. Visões De Um Passado Antigo E Recente (Parte 2).

galactica20041

 

 

 

Por Carlos Lohse

Hoje vamos continuar nossa discussão sobre o universo de “Battlestar Galactica”. Essa série, produzida por Glen A. Larson (ele produzia muitas séries para tv nos fins da década de 70 e início da década de 80) foi repaginada em 2004. Antes de se realizarem os episódios, foi feito um longa-metragem. Se tomarmos esse longa como referência (confesso que ainda não tive a oportunidade de ver a série), encontramos várias diferenças com relação à série original. Agora, os cilônios foram produzidos pelos humanos e se rebelaram contra eles. Os centuriões estão novamente lá, com um design mais irado, mas não dizem uma só palavra. Existem modelos de cilônios que imitam fielmente 12 humanos diferentes. As 12 tribos novamente estão lá, e são destruídas pelos cilônios. Mais uma vez, a Galáctica encabeça uma frota de naves humanas em fuga. Mas agora, há esses 12 modelos de cilônios infiltrados, já que a raça humana não foi totalmente dizimada. É curioso perceber que os cilônios “humanos” não conseguem cumprir com eficiência as missões ordenadas pelo cilônio número 1, pois eles estavam emocionalmente envolvidos com os demais humanos, ou seja, era o amor (por mais piegas que possa parecer) que evitava que eles destruíssem os humanos, o que deixava intrigado o cilônio número 1, o mais frio de todos. O detalhe é que até um dos cilônios número 1 passou a ficar “emotivo” (lembrem-se que havia vários cilônios dos 12 tipos: vários números 1, vários números 2 e assim por diante) . O longa que deu origem à série termina com uma trégua entre os cilônios e os humanos e dois números 1 sendo executados na Galáctica: um mais emotivo e outro mais frio. Detalhe: a execução era ser lançado pelo espaço. Aí, era meio difícil de engolir isso, pois a gente via os caras flutuando no espaço, quando seus corpos deviam, na verdade, explodir, pois saíam de um ambiente com uma atmosfera de pressão do ar para pressão nenhuma. Então, a tendência do corpo seria explodir, como vimos em “O Vingador do Futuro”, do Schwarznegger. Mas como, em muitas ficções científicas, o som se propaga pelo espaço e naves explodem em bola de fogo…

Cilônios com novo design
Cilônios com novo design

Dá para perceber que a história recebeu uma turbinada. Mas algumas coisas pioraram na minha modesta opinião. Todas as referências às culturas antigas praticamente desapareceram nessa nova “Galáctica”. Ao invés disso, a gente via muitas referências ao presente da época em que a série foi feita. Militares com metralhadoras e fuzis, civis andando de terno e gravata, etc. Confesso que não gostei muito disso e acho que corrompeu uma ideia legal da série original, que era fazer uma ponte entre o que se via na história de Galáctica e as culturas antigas, para reforçar a impressão de que a raça humana veio do espaço. Outra coisa que ficou um pouco estranha foi a ligação entre os cilônios e os humanos. Os segundos se viam como uma espécie de criação do primeiro, e houve umas falas meio loucas, um tanto desconexas e místicas, na hora do ataque dos cilônios às tribos. Ficou uma parada meio bicho grilo, o que não acho muito legal numa série de ficção científica. De qualquer forma, o ódio dos cilônios pelos humanos era latente, já que eles se sentiram escravizados. Agora, uma coisa que realmente caiu muito bem nessa nova série é a presença de Edward James Olmos no papel do Comandante Adama. Esse ator foi um ícone dos anos 80. Não podemos nos esquecer de sua participação em “Blade Runner”, como o policial oriental que fazia pequenos bonequinhos com palitos de fósforo e sempre aparecia, de forma bem inconveniente, na frente de Harrison Ford. E, principalmente, como o inesquecível tenente Castillo, de Miami Vice, um homem de poucas palavras e olhar fixo, que sempre conseguia controlar a impetuosidade dos policiais “cascas grossas” Sonny e Tubbs. Ele fez um Adama mais frio e seco, bem ao seu estilo. E devo confessar que só vou procurar me inteirar mais sobre essa série nova da Galáctica mais por causa de Olmos.

Edward James Olmos. O melhor do novo longa
Edward James Olmos. O melhor do novo longa

Dessa forma, “Battlestar Galactica” mostra possuir uma boa história, que deu origem a duas leituras, datadas pela época em que foram escritas e realizadas. A série antiga teve mais referências a culturas antigas, mas menos episódios. Já a série mais nova excluiu essas referências, mas parece que fez uma história mais atraente, pois teve mais episódios. São visões diferentes, mas não menos interessantes. E não deixe de ver o trailer do filme de 2004 abaixo.

Batata Antiqualhas – Battlestar Galactica. Visões De Um Passado Antigo E Recente (Parte 1).

galactica2

 

 

Por Carlos Lohse

Quando o filme “Guerra nas Estrelas” estreou lá nos fins da década de 70, surgiram algumas séries para televisão nos Estados Unidos que se inspiraram em ficção científica espacial. A gente via na Globo, nos domingos à tarde, especificamente dois “enlatados” (era assim que se denominavam as séries de tv americanas na época): “Buck Rogers” e “Galáctica, Astronave de Combate”. A série “Buck Rogers” era mais fajuta. Todo mundo já conhece a história do americano que, em 1987 (a série passou por aqui em 1982), foi ao espaço numa nave, ficou congelado por cerca de 400 anos e voltou para a Terra em 2492, ou seja, em pleno século 25. Já a série “Galáctica” era bem mais interessante. Ela foi inspirada naquela ideia que algumas pessoas meio doidas defendem por aí de que a raça humana tem origem no espaço.  Assim, os humanos teriam formado 12 tribos pelo Universo. Mas o Império Cylon (ou cilônio, para os mais antigos), formado daqueles robôs em formato de centurião romano (eram chamados assim mesmo, de centuriões) e com aquele olho vermelho que ficava andando para lá e para cá (do mesmo jeito que a Supermáquina, do Michael Knight), travou uma guerra de mil anos contra os humanos. Vendo que não conseguiam a vitória, os cilônios simularam uma trégua para fazer um ataque surpresa, o que praticamente dizimou a raça humana, destruindo as 12 tribos. Todas as naves de combate haviam sido destruídas, exceto a Galáctica. Assim, ela passou a liderar pelo espaço uma frota de 1220 naves com os remanescentes da raça humana, enquanto os cilônios as perseguiam. Havia uma lenda de que, quando os humanos deixaram seu mundo de origem, Kobol, um grupo teria formado uma 13ª tribo, que seria justamente o planeta Terra. E assim, a Galáctica viajava pelo espaço em busca do nosso planeta.

Apolo, Adama e Starbuck
Apolo, Adama e Starbuck

Essa série de Glen A. Larson era muito interessante, pois vários elementos da História Antiga da Terra estão presentes. As 12 tribos são uma referência aos judeus. Os cilônios são descaradamente uma referência ao Império Romano. Os capacetes dos pilotos de caça da Galáctica tinham um design que lembrava a cultura egípcia antiga. A religião desses humanos, apesar da influência judaica, era politeísta como várias culturas antigas (eles adoravam “os senhores de Kobol”). Um dos robôs que estavam no alto comando dos cilônios se chamava Lúcifer, e por aí vai. O elenco contava com nomes como Lorne Greene (que ficou famoso na série “Bonanza”), interpretando o Comandante Adama, que liderava a Galáctica, e Dirk Benedict (conhecido por ser o Cara de Pau do Esquadrão Classe A, que passava no SBT), o tenente Starbuck, amigo do capitão Apolo (interpretado por Richard Hatch), filho de Adama. Eles pilotavam os caças que faziam batalhas espaciais contra os caças dos cilônios. Não podemos nos esquecer de John Colicos, que foi o primeiro klingon na série clássica de “Jornada nas Estrelas”, fazia o traiçoeiro Baltar, que se descambou para o lado dos cilônios e perseguia a Galáctica.

Os cilônios!!!
Os cilônios!!!

A série ainda contou com Lloyd Bridges como ator convidado, no episódio duplo onde a Galáctica encontra a astronave de combate Pegasus, comandada justamente pelo Comandante Caim (olha outra referência às culturas antigas), interpretado por Bridges. A Manchete reprisou “Galáctica” na década de 90, juntamente com “Buck Rogers” e a série clássica de “Jornada nas Estrelas”. E aí, pudemos ver alguns episódios novos que não haviam passado na Globo. Nesses episódios, a Galáctica já havia chegado à Terra, mas não podia entrar em contato com os humanos de nosso planeta, pois se os cilônios os descobrissem, teriam tecnologia suficiente para destruir tudo. No lado dos cilônios, já havia robôs com aparências humanas. Do elenco original só havia restado praticamente Lorne Greene, agora ostentando uma elegante barba branca, e o ator Herbert Jefferson Jr, que interpretava o tenente Boomer, um piloto de caça, que meio que foi “promovido” e assumiu um posto de comando na ponte da Galáctica nesses novos episódios. Os efeitos especiais sumiram e víamos dois pilotos de caça andando com suas motos pelas estradas da Terra fazendo missões secretas para defender o planeta dos cilônios. Ah, sim, me esqueci de dizer, as motos voavam (!).

Na conclusão desse artigo, vamos falar um pouco sobre a nova versão de “Battlestar Galactica”, produzida em 2004. Até lá! Mas antes, não deixe de ver o vídeo abaixo!!!