Convencido de que “Jornada nas Estrelas” não voltaria mais, Nimoy partiu para outros projetos como palestras em universidades e teatro. Nessa época, ele encenou uma peça baseada nas cartas entre Vincent Van Gogh e seu irmão Theo. Interpretando o irmão do famoso pintor, mais uma vez um “outsider” (Van Gogh, estereotipado como artista louco, por ter cortado a orelha num momento de desespero) espreitava a vida de Nimoy. O amor de Theo pelo irmão e a convicção de que ele era um grande artista (era Theo quem financiava Vincent) seduziram Nimoy. A peça fez um enorme sucesso. Nesse ínterim, Harve Bennett havia sido chamado pela Paramount para trabalhar em outro filme de “Jornada nas Estrelas”. Bennett já havia trabalhado com Nimoy num filme em 1972, “The Alpha Caper”, onde nosso ator contracenou com Henry Fonda, que, anos mais tarde, o alertara sobre a fatídica propaganda de cerveja. Bennett ficava ciscando para lá e para cá, tentando convencer Nimoy a participar do filme. Pelas leituras de “Eu sou Spock”, dá para perceber que Nimoy negociava com pulso firme, pois sabia da importância de seu personagem, assim como queria preservar a integridade de Spock, algo que ele já fazia durante a série. Ao mesmo tempo em que era durão nas negociações, ele balançava bastante só de pensar que poderia interpretar o vulcano de novo. Foi nesse contexto que Bennett sugeriu se Nimoy queria fazer uma cena de morte. O ator pensou que poderia ser um desfecho primoroso para a série, se tivesse um bom roteiro. Além disso, ele queria ser aproveitado em outros projetos da Paramount. E foi convidado para um telefilme sobre a vida de Golda Meir, uma importante personagem política de História de Israel e que seria interpretada por ninguém mais que Ingrid Bergman. Nimoy interpretaria o papel do marido de Golda, Morris Meyerson. Mais tarde, as apresentações no teatro como Theo lhe renderam mais um convite para trabalhar numa minissérie sobre Marco Polo, que seria gravada na China e onde Nimoy faria um papel de vilão, que ele prontamente aceitou. Assim, de repente, nosso ator tinha três projetos em mãos, precisando filmar em Israel, na China e em Los Angeles. O agente de Nimoy, Merritt Blake, teve que quebrar a cabeça para acertar a agenda do ator, mas conseguiu. Primeiro, foram as filmagens de “Uma Mulher Chamada Golda”, em Israel. Depois, um mês na China para Marco Polo. E, finalmente, para Los Angeles, para filmar “Jornada nas Estrelas II, a Ira de Khan”. Em Israel, houve uma decepção. O diretor do filme, Alan Gibson, só conhecia Nimoy como Spock e era contra a presença do ator no “set” de filmagens. Certa vez, quando Nimoy perguntou ao diretor como devia fazer determinada cena, Gibson foi enfático: “Que diferença faz? Você não é a pessoa certa para o papel mesmo!”, o que deixou Nimoy muito chateado, como não poderia deixar de ser. O estigma do ator de um personagem só volta e meia rondava nosso ator, que procurou esquecer o incidente e focar no trabalho. Mas ele recebeu o roteiro de “Jornada nas Estrelas II” e ficou insatisfeito com a morte de Spock logo ao início do filme, ficando descolada do resto da trama. Com alguns dias de folga, ele foi a Los Angeles ter uma reunião com Bennett e Nicholas Meyer, que havia sido escalado para ser o diretor do filme. Meyer concordou com Nimoy com relação ao roteiro e o reescreveu, dando novas esperanças quanto ao futuro da morte de Spock. De volta a Israel, Nimoy terminou as filmagens com uma Bergman já muito doente em virtude do câncer, mas muito elegante e profissional, onde eles fizeram uma das cenas finais de mãos dadas.
Cabe dizer aqui que o casal já estava divorciado e não se via há alguns anos. Nimoy quis tirar a tensão do divórcio pegando nas mãos de Bergman, que prontamente aceitou fazer a cena assim. As filmagens finais ocorriam no dia em que o presidente do Egito, Anuar Sadat, foi assassinado por estabelecer uma política de paz com Israel, e havia medo de que o país fosse atacado. No dia seguinte, Nimoy partia para a China com o remorso de ter deixado a equipe de filmagem para trás naquela situação. Em Pequim, ele encontrou uma China ainda descobrindo o capitalismo, onde havia um choque claro entre os comunistas mais antigos e as pessoas mais novas, de tendências capitalistas. Houve também os problemas das barreiras linguísticas como o fato de seu motorista não saber uma palavra de inglês, ou um figurante chinês aprender a pronúncia correta em inglês com uma equipe de filmagem toda italiana (dá para imaginar o desastre que foi). O mais interessante é que nosso ator podia circular livremente pelas ruas sem ser conhecido. Ele chegou até a comer num restaurante popular, achando tudo maravilhoso. Através de uma versão asiática e em inglês do “The Wall Street Journal”, ele descobriu que a notícia da morte de Spock já havia vazado e os fãs estavam revoltados. Ele deu uma risada, pois percebeu que até na China a notícia da morte de Spock havia chegado.
No próximo artigo, falaremos das filmagens de “Jornada nas Estrelas II, a Ira de Khan”, considerado por muitos fãs um dos melhores longas da série. Até lá!