Quando a versão final de “Jornada nas Estrelas 4, A Volta Para Casa” foi exibida para um público-teste, houve muitas risadas nos momentos certos. Algumas pessoas, como críticos de cinema, acharam que o filme estava engraçado demais e os fãs não gostariam, pois eles queriam ser levados à sério. Nimoy sabia que isso não era verdade, já que a série clássica tinha bastante senso de humor. O público também descobriu que Nimoy poderia fazer comédia, pois ele sempre havia sido considerado uma pessoa muito séria por causa de Spock. Nimoy, entretanto, sempre fora um grande fã de Abbott e Costello, uma dupla de comediantes que fez muitos filmes décadas atrás. Assim, Nimoy foi chamado para dirigir “Três Solteirões e um Bebê”. Outros três diretores foram chamados, mas eles desistiram do projeto. Katzenberg, executivo da Paramount, decidiu deixar com Nimoy a direção ao invés de chamar mais diretores. Como o filme era um “remake” de um filme francês, o roteiro foi reescrito para ficar mais “americanizado”. Quem vivenciou a década de 1980 lembra dessa doce comédia estrelada por Tom Selleck (o inesquecível Magnum), Steve Gutenberg (que fez vários “Loucademia de Polícia”) e Ted Danson, que recebiam uma menina recém-nascida na porta de um apartamento para lá de irado, com as paredes todas pintadas com lindas figuras. O apartamento no filme original tinha decorações em estilo egípcio, muito “velho mundo” para Nimoy, que optou por algo mais moderno, mais “Nova York”, onde os personagens seriam retratados nas paredes com desenhos e ficariam lá expressas as características deles.
As filmagens transcorreram sem muitos problemas, exceto por um dia em que foi necessário fazer uma tomada externa mais elaborada que demandava muito tempo e a posição do Sol influenciaria demais a cena. Isso sem falar das nuvens, que faziam sombra a toda hora, interrompendo ainda mais as filmagens. Para piorar a situação, pessoas que passavam pelas ruas reconheciam Tom Selleck e falavam com ele (“Oi, Magnum!”). Havia, na cena, um policial montado a cavalo que teria uma pequena participação. Mas o ator que fazia o policial nunca havia montado um cavalo e prendeu mal o bichinho antes de entrar no prédio com Tom Selleck, que mostraria a carteira de identidade que ele tinha esquecido no apartamento. O que aconteceu? O cavalo se soltou e seguiu o policial prédio adentro. A cena teve que ser cortada, pois, apesar de tentarem aproveitá-la, ela se revelou irrelevante para o filme, que foi bem aceito pelo público, arrecadando mais de 165 milhões de dólares de bilheteria.
Após as filmagens, Nimoy viajou para a Rússia, para uma exibição comemorativa de “A Volta Para Casa”, pois na ocasião aquele país havia proibido a caça da baleia. Nimoy aproveitou para visitar a cidade dos pais, Zaslav, na Ucrânia, onde ele ainda tinha parentes que nem conhecia. A visita foi um fiasco total, pois ninguém conhecia “Jornada nas Estrelas” na Rússia, os parentes de Nimoy não falavam inglês e ele não falava russo. Eles se comunicaram com um intérprete e com algumas palavras em ídiche. Houve, também, uma desconfiança, por parte dos parentes de Nimoy de que ele fosse um agente do governo soviético designado para vigiá-los. Nem precisa dizer que a visita foi um mal-estar geral. De volta aos Estados Unidos, Nimoy foi surpreendido pela notícia de que seu pai estava muito mal de saúde. Ele passou os últimos dias da vida de seu pai junto com ele, compartilhando fotos e pequenas filmagens que havia feito da terra natal da família durante a viagem. Para Nimoy, a ficha da morte do pai demorou a cair, e ele suspeita que a lógica vulcana tenha tido alguma interferência nisso. Ele ficou muito agradecido de Shatner ter comparecido ao enterro de seu pai.
Depois do sucesso de público e crítica de “Três Solteirões e um Bebê” e novos comentários surpresos de que o intérprete de Spock podia fazer comédia, Nimoy foi chamado para dirigir um projeto mais sério e polêmico: o filme “O Preço de Uma Paixão”, que seria estrelado por Diane Keaton, Liam Neeson e Jason Robards. O mais curioso é que Nimoy fora convidado mas não tinha garantias de que ia dirigir o filme já que, depois de “A Volta Para Casa” e “Três Solteirões e um Bebê”, agora ele era rotulado como especialista em comédias. A história falava de uma moça, Anna, que havia tido uma criação muito opressora dos pais e se casou com um marido igualmente opressor. Ela teve uma filha e não queria que a menina sofresse toda a repressão sexual que ela sofreu, educando-a de uma forma livre. Anna se separa de seu marido e começa um novo relacionamento com Leo, um jovem escultor. A forma livre com que Anna cria a filha, permitindo até que a menina veja a mãe e o novo namorado nus, choca o pai, que inicia uma batalha judicial pela custódia da filha. E Anna perde a filha e Leo em todo o processo. Nimoy ficou com muita vontade de dirigir o filme, já que a história, em sua opinião, não tinha vilões individuais em si, mas sim um sistema e uma sociedade cheia de valores altamente conservadores que destruíram a vida de Anna. Outro detalhe que atraía Nimoy é que a trama era shakespeariana e trágica, sem o famoso “happy end” dos filmes americanos. Ele conseguiu convencer o produtor do filme, pois disse que era de Boston, onde se passava a história, conhecendo bem o conservadorismo daquela sociedade, e que tinha uma experiência em teatro que se aproximava da temática do filme. Vários atores recusaram os papéis, pois tiveram medo do que isso poderia implicar na carreira deles (há uma cena em que a filha de Anna toca no pênis de Leo, ficando claro que é somente para satisfazer uma curiosidade e que não houve qualquer má intenção no ato). Por isso, Nimoy ficou admirado com o fato de Diane Keaton aceitar fazer o papel de Anna e Liam Neeson aceitar fazer o papel de Leo. Jason Robards foi chamado para fazer o advogado de Anna, mas ele relutou em aceitar, pois o advogado era conservador e disse que Anna só teria alguma chance se reconhecesse que havia cometido um erro perante o juiz, que era muito puritano. Nimoy defendeu o personagem dizendo a Robards que o advogado queria ajudar a moça e lhe propôs essa saída já que ele conhecia bem o sistema judiciário e seu conservadorismo. Robards, que tinha uma amizade com Nimoy, acabou sendo convencido e pegou o papel.
Foi uma época em que Nimoy estava muito sensível e chorava toda a noite, em parte porque a história do filme tinha uma carga emocional muito forte, em parte porque ele havia perdido seu pai e, pouco tempo depois, sua mãe. As filmagens também tiveram contratempos, como a necessidade de Diane Keaton ter que filmar uma sequência com forte carga de emoção duas vezes, já que as duas câmaras usadas tinham filmes que não podiam ser editados juntos. Nimoy comprou até rosas para a atriz para lhe dar a má notícia (repetir uma cena longa e altamente emotiva é uma tarefa muito desgastante). Mas Keaton foi altamente profissional e repetiu tudo. As impressões sobre o sucesso de “O Preço de uma Paixão” foram as melhores possíveis na exibição teste. Mas as reações de público e crítica eram muito extremas. Ou o filme era excelente ou péssimo, não havendo meio termo, o que fez com que ele logo deixasse de ser exibido, para a decepção de Nimoy que, lá no fundo, já sabia que ia gerar muita controvérsia. Nimoy fala com desgosto de que talvez ele devesse ter feito algo mais comercial, com o “happy end”. Mas ele ainda mencionou que não era disso que o filme tratava.
No próximo artigo, vamos falar da produção de “Jornada nas Estrelas 5”. Até lá!