Falando ainda dos livros do Universo Expandido de Guerra nas Estrelas pela Aleph, temos o último livro da Trilogia Thrawn de Timothy Zahn. “O Último Comando”, que tem a importante missão de costurar todas as tramas da história e dar um desfecho à altura da Trilogia. De todos os livros lançados pela Editora Aleph referentes ao Universo Expandido de “Guerra nas Estrelas”, a Trilogia Thrawn foi, de longe, a mais interessante e bem escrita. A grande virtude da Trilogia foi criar várias subtramas que se interligavam com grande eficiência. O autor ia dando pequenos detalhes que, mais à frente se encaixavam em outras situações, provocando um encadeamento muito bem elaborado. Um detalhe muito bem usado por Zahn foi fazer sempre referências a situações ou falas que apareceram na Trilogia Clássica (os Episódios IV, V, VI), o que dava um grande tom de legitimidade à história. E se você acha que precisa dar uma relida no livro anterior da Trilogia antes de encarar o próximo para recordar detalhes da história, pode ficar despreocupado, pois Zahn relembra todos os pontos necessários. Por essas e por outras, muitos fãs consideram essa Trilogia os verdadeiros Episódios VII, VIII e IX.
Só para falar um pouquinho por alto da trama (alguns “spoilers” de leve para encorajar a leitura), a história se passa cinco anos depois dos eventos de “O Retorno de Jedi”. A Nova República ainda busca se consolidar, sendo formada por vários grupos que ainda não se entendem muito bem. Por outro lado, o Império ainda controla uma parte da galáxia. Esse dado corrige um fato inaceitável em “O Retorno de Jedi”: um poderoso Império Galáctico do Mal ser derrotado por uma facção rebelde ajudada por um grupo de ursinhos de pelúcia beiçudos (por que você fez isso, George Lucas?). E o líder do Império agora é um grão-almirante. Havia doze grãos-almirantes e a Aliança Rebelde pensava que tinha dado cabo de todos eles, numa alusão de que o pau não quebrou somente em Endor (esses detalhes já nos mostram como Zahn leva o Universo de “Guerra nas Estrelas” muito mais a sério do que Lucas). Esse é o grão-almirante Thrawn. Esse é o cara!!! O grande trunfo de Zahn! Ouso dizer que é um vilão à altura de Vader ou até além. Se Vader era o mal em pessoa e era implacável, matando seus desagrados com o uso da força, Thrawn é muito mais maquiavélico, no sentido de que ele morde e assopra. Ele raramente mata alguém e prefere controlar as pessoas com um terrorismo psicológico sem precedentes. Mas sabe também dar promoções aos seus subordinados, mesmo em situações adversas de um ataque fracassado, por exemplo. É só o comandado saber analisar a situação racionalmente, mesmo sob a pressão do medo e buscar alternativas plausíveis para sanar o problema. Isso fazia com que o grande líder fosse simultaneamente amado e temido por seus subordinados, bem ao estilo do que Maquiavel recomendava no capítulo 13 de sua obra “O Príncipe”. Esse quê maquiavélico de Thrawn aparece progressivamente ao longo da Trilogia, sendo coroado agora em “O Último Comando”.
Para auxiliar Thrawn na reconquista da galáxia, Zahn criou o personagem C’Baoth, um mestre jedi altamente instável emocionalmente. Essa instabilidade também é crescente ao longo da Trilogia e o motivo dela é algo muito bem bolado, mas essa vou deixar para vocês procurarem lá nos livros. O trato entre Thrawn e C’Baoth consiste no jedi auxiliar Thrawn com a força e o grão-almirante fazer todos os esforços para capturar Luke Skywalker, Leia Organa Solo (a princesa se casou com o contrabandista Han Solo!) e seus filhos gêmeos, para C’Baoth treiná-los e moldá-los aos seus planos de dominar a galáxia. Essa aliança entre o jedi e o grão-almirante vai infernizar a Nova República, ainda frágil politicamente, principalmente pelo fato de que Thrawn é um excelente estrategista em muitas áreas e consegue antecipar todos os movimentos da Nova República. Há, ainda, um grupo de contrabandistas liderado por Talon Karrde, que conta com a ajuda da enigmática personagem Mara Jade, que tem como objetivo principal de sua vida matar Luke Skywalker. Por que? Vá ler o livro!!!
A história ainda se desdobra em mais personagens e subtramas, e assim podemos ver toda a saga visitando vários planetas, detalhadamente descritos por Zahn, que nos ajuda e muito a construir toda uma memória visual. Eu diria que Zahn tem um estilo muito cinematográfico em seus textos, a ponto de, mal comparando, se assemelhar até a João do Rio em alguns momentos, que falava detalhadamente da vida e do cotidiano do Rio de Janeiro no século XX. Uma descrição muito cinematográfica, assim como a de Zahn.
E o desfecho da Trilogia? Calma, não darei “spoilers” aqui. Só vou dizer que fiquei um pouco decepcionado. A obra foi tão grandiosa que eu confesso que eu queria algo um pouco mais pirotécnico. Zahn tinha dois desfechos simultâneos. E ele priorizou mais um desfecho que outro, o que eu achei uma pena. E o desfecho menos priorizado acabou de uma forma excessivamente simplória. Confesso que queria muito mais. Talvez o que salve esse desfecho simplório tenha sido a fina dose de ironia nele, que não condiz com o que foi apresentado ao longo do livro. Daí a ironia… Mas confesso que fiquei com cara de tacho.
Outra coisa que lamentei foi um número excessivo de erros de revisão no texto. Os livros iniciais da Aleph não tinham tantos erros de revisão. Mas, com o tempo, e talvez com a pressa de lançar novos livros todo mês, os erros de revisão se multiplicaram. Vemos desde erros de digitação até de concordância, verbos mal conjugados, palavras repetidas, palavras que faltam. Toda vez que eu pegava o livro para ler, me deparava com um ou dois erros. E eu peguei o livro para ler várias vezes, pois só posso fazê-lo em doses homeopáticas. Tudo bem, eu sei que errar é humano, que sempre alguma coisa passa, mas tanto em “O Último Comando” quanto em “Um Novo Amanhecer”, os erros de revisão foram excessivos. Eu também sei que esses lançamentos buscaram ser alavancados pela estreia do Episódio VII na ocasião, mas talvez fosse melhor lançar uma quantidade um pouco menor de livros mais cuidadosamente revisados. Todos esses erros acabam pegando mal para um trabalho tão bem feito e elogiado que a Aleph faz. Fica feio…
De qualquer forma, a experiência de ler o Universo Expandido de “Guerra nas Estrelas” tem sido esplêndida e confesso que não tenho conseguido ler mais nada desde que a Aleph se apossou de nossas almas. Como eu já disse em outras ocasiões, esses livros dão um tom de seriedade à saga que Lucas infelizmente não deu, quando o criador de “Guerra nas Estrelas” buscava um caminho mais lúdico e aventureiro. O Universo Expandido, pelo contrário, tem os pés mais no chão, enreda uma boa trama política, é uma ficção científica mais séria, ou seja, para fazer uma pequena provocação, aproxima “Star Wars” das melhores coisas que vemos em “Star Trek”. E isso é um elogio, pois eu sou um trekker assumidíssimo que também gosta muito de “Guerra nas Estrelas”, que praticamente deu o pontapé inicial em minha cultura cinematográfica lá no final da década de 70. Por essas e por outras, os livros do Universo Expandido são altamente recomendados, por darem novas perspectivas à “Guerra nas Estrelas”.