Um filme espanhol falado em catalão e premiado no Festival de Berlim já paira há algum tempo em nossas telonas. Trata-se do curioso “Verão 1993”, uma película um tanto idílica escrita e dirigida por Carla Simón, que fala de uma menininha chamada Frida, uma garotinha que tem aparentemente uma boa vida, mas que seu passado guarda um trágico acontecimento. E aí, a mocinha mal sabe do porquê de sua guinada na vida.
Frida morava na casa dos avós paternos. Tanto o seu pai quanto sua mãe haviam morrido de uma forma misteriosa. Com o tempo, Frida irá morar na casa do tio, que tem uma esposa e uma filhinha chamada Anna, que será a sua amiguinha. A casa dos tios fica no campo e ela terá uma vida idílica com sua nova família. Por um bom intervalo de tempo no filme, vemos duas menininhas (uma na casa dos seis anos e outra na casa dos três anos) brincando e se divertindo no quintal de uma casa cercada por florestas por todos os lados, algo que pode ser muito maçante e que te coloca uma dúvida na cabeça do porquê desse filme ter sido tão bem falado num festival de importância como o de Berlim. Entretanto, com o desenvolver da película, a gente vai começando a perceber a sua importância, quando sabemos que o pai e a mãe de Frida morreram de um “vírus” (agora fica óbvio o que os matou) e de como a menina passa a ter dificuldades de relacionamento com seus tios e com a priminha, já que ela foi criada com muito mimo pelos avós em virtude de sua situação trágica e sua postura pode, inclusive, levar a algumas situações um tanto perigosas, o que vai provocar sérias dificuldades de relacionamento e mostrar que a vida idílica no campo pode não ser tão idílica assim.
Mesmo que o filme seja em grande parte muito arrastado, esses pequenos elementos nos despertam a curiosidade e nos chamam a atenção. Agora, creio que o que mais chamou a atenção na película foi o seu desfecho (que, infelizmente, não posso contar aqui), pois ele destoou totalmente de toda a situação de anticlímax da película e bombardeou o espectador com uma explosão emocional, marcando uma espécie de “fim de infância”. Nesse momento, o espectador é sacudido da letargia que entorpecia todo o filme para uma postura mais comovida, vindo em seguida, o fim abrupto, deixando quem assistia suspenso no ar na cadeira, sem saber muito o que fazer com o que via. Obviamente, uma situação de grande impacto.
Assim, se “Verão 1993” é um filme em sua grande parte lento e letárgico, alguns pequenos elementos que são introduzidos em seu desenrolar fazem com que o espectador prenda sua atenção na tela e o final totalmente destoante de toda a sua execução fisga com maestria a todos que o assistem. Esse pode ser o segredo de todos os louros de sua premiação, não sem constatar que a película tem os seus valores, tais como um retorno aos dias de infância. Vale a pena dar uma conferida, apesar da letargia.
Os irmãos Ethan e Joel Cohen voltam a atacar e assinam o roteiro, juntamente com George Clooney (que também é o responsável pela direção) do bom filme “Suburbicon: Bem Vindos ao Paraíso”. Mais uma vez temos o (des) prazer de constatar como algumas estruturas consideradas muito arcaicas na sociedade estadunidense ainda se fazem presentes, principalmente quando vemos alguns discursos de ódio proferidos por alguns grupos por aí. Tais grupos já não deveriam ter um mínimo de voz, mas parecem que estão cada vez mais poderosos e atuantes, pois o discurso retrógrado de um filme que se passa em tempos pretéritos soa ainda muito familiar.
O filme em si se passa em meados da década de 50, quando o “American Way Of Life” institucionalizou a vida paradisíaca nos subúrbios, longe da agitação das grandes cidades, formando comunidades isoladas e um tanto autossuficientes, com serviços próprios de comércio, bombeiros, hospitais, etc., tudo para que os moradores desses supostos “Édens” paradisíacos não necessitem sair de seu bairro isolado do resto da humanidade. Suburbicon será o paradigma ideal desses bairros de subúrbio. Mas a coisa muda um pouco de figura quando um casal negro vai morar no bairro, o que provoca o afloramento de um racismo num lugar onde nunca ninguém sequer teve a leve intenção de escondê-lo. Duas irmãs gêmeas que eram vizinhas do casal negro (ambas interpretadas por Julianne Moore) induzem o menino da casa a brincar com o filho do casal negro para quebrar um pouco o gelo. À noite, a casa será invadida por dois homens que irão usar clorofórmio nas irmãs, no chefe da família (interpretado por Matt Damon) e no menininho. Todos irão parar no hospital e uma das irmãs morrerá, pois ela era tetraplégica e era mais fraca que os demais. Essa irmã tetraplégica é mãe do menininho e esposa do chefe da casa. A partir daí, o filme se desenrolará numa sucessão de tramas onde o racismo é apenas a ponta do iceberg e o menor dos problemas.
Esse é um filme, acima de tudo, sobre como uma comunidade aparentemente austera como a branca americana pode produzir algumas células desajustadas aqui e ali, embora toda a motivação do crime seja mais um caso particular que quer se espelhar como geral. Ou seja, os artífices de um crime bem peculiar não necessariamente devem ser encarados como um produto da sociedade (nem todos da sociedade WASP cometeriam tal delito), mas, por outro lado, o filme alerta como tal manifestação um tanto psicótica pode acontecer nas melhores famílias. Como a sociedade de Suburbicon está mais preocupada em execrar a família negra, ela mal percebe que toda uma trama diabólica provocada por seus vizinhos de bem acontece bem debaixo de seu nariz. Mas essa sociedade aparentemente etérea e não psicótica pode tomar atitudes bem desprezíveis ao atacar com violência a família negra. Nesse ponto, podemos dizer que há uma doença em nível social.
Dá para perceber, pela descrição acima, que a coisa não é muito trivial. Não é à toa que a película toma direções um tanto absurdas em alguns momentos, o que ajuda muito a prender a nossa atenção. Todo esse absurdo destoa completamente daquela sociedade altamente utópica e nos lança dentro de uma distopia e de uma psicose total.
Os atores estiveram muito bem. Moore teve a competência de interpretar dois papéis um tanto diferentes. Damon, ao fazer o pai íntegro, consegue conduzir bem o jogo da trama, que vai se desabrochando aos poucos, atraindo a atenção do espectador. Tivemos, também, a ótima presença de Oscar Isaac, como um corretor de seguros que investiga falcatruas de seus clientes, sendo simpaticamente cínico e perigoso, numa mostra de que ele não deve apenas ser lembrado como o Poe Dameron de “Guerra nas Estrelas”. Mas devemos dar um destaque todo especial ao ator mirim Noah Jupe (que também está no filme “Extraordinário”) que fez o papel do filho da família protagonista. Foi ele que começou a perceber que o crime praticado em sua casa tinha um rumo um tanto diferente do que parecia que ia tomar. E o menino convenceu bastante ao ficar indefeso nas mãos de um monte de adultos sem escrúpulos.
Assim, “Suburbicon” é mais um daqueles filmes dignos de nota, pois ele nos ajuda a pensar sobre questões do cotidiano como o conservadorismo, o racismo e de como um verniz de utopia pode ser algo muito frágil ao esconder uma distopia total. Um crime que toma rumos um tanto inesperados que passam despercebidos numa sociedade cega por suas convenções retrógradas. Um filme que abraça o inusitado e o absurdo, tornando-o mais interessante do que uma película meramente reflexiva. Um filme imperdível.
Um dos aspectos dos quadrinhos da “Turma da Mônica Jovem” é o uso, em alguns gibis, de uma temática mais voltada para a ficção científica. Os roteiristas de Maurício de Sousa já nos deram várias mostras disso. E uma característica da ficção científica chama a atenção aqui: as histórias com robôs. Presentes em edições como a 32 e a 73 da primeira temporada da “Turma da Mônica Jovem”, os androides retornam agora na edição 11 da segunda temporada, em mais uma história recheada de implicações filosóficas que estimulam a reflexão dos leitores.
Tudo começa num jogo de videogame online onde Cebola e seus amigos são derrotados, por Nick, o Geek. Ainda enfurecido com a derrota, Cebola recebe a bolada de uma estranha esfera que entra à toda pela janela de sua casa. Cebola descobre que a tal bola é um robô sensciente que tem uma programação bem específica: aprimorar nosso protagonista. O problema é que o robô é muito objetivo e insensível em suas análises, o que incomoda um pouco Cebola e seus amigos. Cebola irá inicialmente usar o robô para aprimorá-lo nas suas habilidades de gamer. Mas a unidade androide percebe que, para melhorar os humanos, ela precisa melhorar a si própria, e pede a Franja que faça um corpo para ela. Entretanto, uma questão fica no ar: de onde veio esse robô? Qual é a verdadeira intenção de sua programação? Paremos por aqui com os spoilers.
Histórias de robôs sempre levantam questões muito interessantes e aqui não é diferente. Em primeiríssimo lugar, a questão do aprimoramento. É algo razoável que um robô consiga se desenvolver com sua experiência e superar os parâmetros de sua programação ou tudo soa como uma balela sem tamanho? Renomados cientistas como Marcelo Gleiser já nos chamaram a atenção de como a questão da consciência é algo extremamente complexo. Segundo Gleiser, mesmo que o ser humano conseguisse desenvolver uma máquina que reproduzisse com fidelidade total as funções do cérebro humano, ainda assim não poderemos dizer que ela vai ter uma consciência. Assim, para se aprimorar e se superar, o robô precisa, antes de mais nada, ter consciência, o que é tecnicamente impossível. A existência de uma consciência traz também a questão do livre arbítrio. Na própria história, chega o momento em que o robô precisa fazer uma escolha, o que não significa necessariamente que seja a mesma escolha que a turma da Mônica já “elegeu” para o robô, como se ele não tivesse vontade própria. Assim, as fronteiras entre a máquina e o humano passam pela consciência, pelo aprimoramento e pelo livre arbítrio, quesitos que, por exemplo, um celular ou um laptop não têm.
É muito curioso que Maurício de Sousa, em sua coluna “Fala, Maurício” ao fim da revista, tenha mencionado a existência das Três Leis da Robótica, de Isaac Asimov, como leitura complemento para essa edição. Essas três leis são: 1) Um robô jamais deve fazer mal a um humano, ou por inação permitir que um humano sofra algum mal; 2) Um robô deve sempre obedecer a um humano, desde que isso não entre em conflito com a primeira lei; 3) um robô deve proteger a própria existência, desde que isso não entre em conflito com a primeira e segunda leis. Asimov nos deu contos e histórias deliciosas sobre robôs, onde essas três leis interagem seguidamente. Aqui tivemos algo não tão semelhante, mas que se aproximava um pouco do Universo Asimoviano, onde o robô, a priori insensível, “se arrepende” ao ser agressivo com a turma, pois uma situação específica ativou nele uma sub-rotina de combate, algo que hoje chamamos de “bug”. Tal momento da revista é o que mais se aproxima, embora de forma pouco elaborada, em virtude da proposta de maior entretenimento desse veículo midiático que são os quadrinhos da Turma da Mônica, das Três Leis da Robótica de Asimov. De qualquer forma, não deixa de ser notável que uma revista em quadrinhos mais dirigida para o público adolescente (e, por que não, adulto?) aborde questões mais reflexivas desse naipe, num momento em que as cabeças têm pensado tão pouco em nosso país.
Assim, vale mais uma vez a pena procurar nas bancas especializadas que vendem gibis mais antigos essa edição da “Turma da Mônica Jovem” (a edição chegou às bancas no mês passado), especialmente os fãs de ficção científica.
O personagem de Spock ficou muito famoso e ele aceitava o máximo de aparições públicas que podia, para fazer dinheiro. Nimoy sabia que sua carreira não lhe dava a estabilidade necessária e ele devia aproveitar todas as oportunidades. Mas essas aparições passaram a ficar até perigosas, pois a quantidade do público querendo ver o vulcano em pessoa era muito grande e Nimoy precisou até de seguranças, algo que ele não gostava, pois em sua infância ele pediu um autógrafo para um ator de teatro de nome Danny Kaye, de quem muito gostava, sendo prontamente ignorado. Nimoy pensava com seus botões que, se um dia fosse famoso, daria autógrafos para todos que lhe pedissem. Mas a coisa fugiu ao controle, ao ponto de Nimoy precisar fugir de escada magirus do corpo de bombeiros de um prédio de uma loja de departamentos em Long Island (ele havia ficado encurralado no alto do prédio). Desnecessário dizer que ele precisou trocar o seu número de telefone e, além disso, ele precisava embarcar às escondidas nos aviões em aeroportos, não sem ser anunciada sua presença pelo comandante do voo depois de devidamente instalado no avião.
As relações entre Nimoy e Roddenberry eram estritamente profissionais, pois Nimoy não gostava de certos comportamentos de Roddenberry. Certa vez, Nimoy encomendou a Roddenberry uma opala, pedra preciosa para o anel de sua esposa. Roddenberry e Barrett poliam e vendiam pedras preciosas. Inicialmente foi combinado um preço digamos, mais camarada. Mas, depois Roddenberry havia mudado de ideia e deu um preço bem mais caro. Só que tudo era uma brincadeira e as risadas de Roddenberry e Barrett deixavam Nimoy bem constrangido (como Spock ficaria!). As discussões entre Nimoy e Roddenberry sobre os rumos do personagem Spock só ajudaram a deteriorar ainda mais a relação entre os dois.
As relações entre Nimoy e Shatner também sofreram desgastes, seja na distribuição das falas dos personagens, seja em incidentes mais isolados como o fato de que Shatner não aceitou que Nimoy fizesse uma sessão de fotos na sala de maquiagem logo pela manhã. Roddenberry chegou a consultar Isaac Asimov sobre essas briguinhas e o grande escritor de ficção científica sugeriu tornar Kirk e Spock amigos inseparáveis onde, na visão do público, um ficaria ligado ao outro.
No meio da 2ª temporada de “Jornada nas Estrelas”, a NBC deu sinais de que cancelaria a série, pois achava que, embora houvesse muitos fãs devotados, o número não era suficiente. Uma fã, Betty Jo, e seu marido, entretanto, fizeram uma campanha onde era pedido aos fãs que enviassem muitas cartas à emissora de TV contra o cancelamento da série, o que garantiu uma terceira temporada. Foi prometido o bom horário de 19h30min de segunda-feira para a exibição dos episódios. Mas depois o horário foi mudado para as sextas-feiras às 22h, justamente quando o público adolescente saía para se divertir. Roddenberry ficou furioso e disse que estaria fora se o horário não fosse mudado. A NBC ignorou o blefe e manteve o horário, restando a Gene abandonar “Jornada nas Estrelas”. O mesmo aconteceu com D. C. Fontana, que quis investir mais na carreira de escritora. A emissora, então, chamou Fred Freiberger para tomar as rédeas da série, um antigo amigo de Nimoy. Mas Freiberger queria que a série fosse menos cerebral e com mais ação, o que desvirtuou o espírito de “Jornada nas Estrelas” e azedou as relações com Nimoy. Os episódios também foram extremamente sofríveis como “O Cérebro de Spock”, onde mulheres alienígenas sequestram o cérebro do vulcano, obrigando McCoy a instalar um aparelho na cabeça de Spock e conduzi-lo para lá e para cá como um autômato (lamentável), numa história sem sentido e com fraco conteúdo, sem abordar questões mais profundas. Outros exemplos de episódios ruins foram “Todos os nossos ontens”, onde ele se apaixonou e comeu carne, e “Os Herdeiros de Platão”, onde Spock foi obrigado a dançar flamenco por uma raça alienígena avançada, mas muito prepotente e má (foi nesse episódio que também ocorreu o famoso beijo inter-racial entre Kirk e Uhura). Mas houve bons episódios como “O Incidente Enterprise”, onde Kirk e Spock tapeiam uma capitã de uma nave romulana para roubar seu dispositivo de camuflagem. Há excelentes cenas entre Spock e a capitã, que é seduzida pelo vulcano. Apesar de ter saído da série, o episódio tem a assinatura de D. C. Fontana, que fugia dos estereótipos machistas da época, que minimizavam as mulheres, e criava interessantíssimas personagens femininas.
A mudança de diretores e roteiristas com o correr dos episódios fazia com que se perdessem um pouco as características principais dos personagens. E aí Spock também entrava nisso. Nimoy, obviamente, assinalava esses problemas, o que causava atritos, principalmente com Fred Freiberger, o que ajudou a levar a situação para o cancelamento da série.
Logo depois do cancelamento, foi oferecido a Nimoy um papel na série “Missão Impossível”, onde ele faria um personagem mestre em disfarces, Paris, o Grande. Mas esse personagem era, segundo Nimoy, muito vazio, sem um passado, se comparado a Spock que ainda povoava a mente de nosso ator e lhe fazia muita falta. Nimoy pediu para sair de “Missão Impossível”, uma atitude que poucos tomariam na época. Nesse contexto (início da década de 1970) ele estreou na direção num episódio de “Galeria do Terror”. Em 1971, Nimoy foi chamado para participar de um filme chamado “Catlow”, com Yul Brinner (o Ramsés de “Os Dez Mandamentos de Cecil. B de Mille) e Richard Crenna (Trautman, o “amigo do Rambo”). Ele também passou a atuar em teatro, no musical “Um Violinista no Telhado”, sobre um judeu da comunidade russa. A peça foi sucesso de público e crítica, o que deu a Nimoy a chance de fazer mais algumas peças de teatro.
No próximo artigo, falaremos mais da carreira de Nimoy e sua volta a “Jornada nas Estrelas”. Até lá!
Esse final de ano nos brindou com um excelente documentário. Eu diria mesmo um grande presente de Natal. “Lumière, A Aventura Começa”, é um deleite para os olhos de qualquer fã de cinema. Realizado de forma muito simples por Thierry Frémaux e contando com a presença mais que ilustre de Bertrand Tavernier e Martin Scorsese, esse singelo documentário é uma homenagem aos irmãos Lumière, que são considerados os pais fundadores do cinema moderno.
O filme consiste basicamente em apresentar 108 dos cerca de 1400 filmes dos irmãos Lumière, com a narração de Frémaux. Essas 108 películas de cerca de cinquenta segundos cada uma foram divididas em vários assuntos. Tivemos a oportunidade de ver a famosa saída dos trabalhadores da empresa Lumière, considerada o primeiro filme de cinema, e saber que houve várias versões desse filme. Outras películas onde apareciam crianças da família dos irmãos cineastas já ensaiavam os primeiros closes.
O documentário também deixa claro que, apesar dos filmes terem a intenção, na maioria das vezes, de registrar a vida cotidiana, os irmãos Lumière sempre os faziam com alguma encenação, mesmo que fosse mínima. O filme que mostrava a demolição de uma parede teve a curiosidade de ser rebobinado numa sessão com a luz do projetor acesa, o que provocou grande espanto do público ao ver a parede sendo “remontada”.
Outra curiosidade foi o fato de que os dois cineastas começaram a viajar pelo mundo para tirar “vistas” de outros países considerados mais exóticos aos olhos dos europeus, como o Egito. Mas tomadas da Inglaterra, Estados Unidos e do próprio sul da França também estão entre essas tomadas “estrangeiras”. Os irmãos Lumière também fizeram filmes de enredo, geralmente comédias, onde sempre aparecia uma pessoa rindo da situação para mostrar de que se tratava de um filme cômico que terminava, na maioria das vezes, em cenas de pancadaria deliciosamente simulada. Era muito interessante ver que existia ainda toda uma preocupação em se mostrar alguns tipos de trabalho ou então detalhes da modernidade que assolava aqueles dias do fim do século 19 ou também alguns esportes como o ciclismo. Um filme em específico choca bastante: duas ricas francesas, na Indochina, às risadas, jogando moedas para uma população local faminta e desesperada por algum dinheiro que pudesse amenizar sua pobreza.
Frémaux é categórico ao dizer que esse filme hoje é um documento ícone do neocolonialismo francês na Ásia. Mas, cá para nós, isso também não lembra uma situação muito específica que vemos num programa de TV de um país sul-americano cujo nome começa com “B” e não é a Bolívia?
Assim, “Lumière, A Aventura Começa” é um programa obrigatório para todos os cinéfilos de plantão, pois descortina com maestria parte da prolífica produção dos irmãos Lumiére, sendo um testemunho do nascimento do cinema e uma fonte histórica inestimável de tempos muito antigos, mas nem por isso, menos interessantes. É o tipo do filme para ver, ter e guardar.